O Pontífice surpreendeu não somente pela realização de um segundo consistório num mesmo ano (o último foi celebrado em 18 de fevereiro), como também pela exclusão de uns e inclusão de outros, desmentindo as listas que já circulavam nos círculos especializados.
Depois do anúncio já se deu bastante destaque ao fato de não haver italianos ou mesmo europeus entre os futuros purpurados.
É um costume bastante estabelecido que o Patriarca de Veneza seja criado cardeal no primeiro consistório seguinte à sua nomeação – é tão certa a criação que o novo patriarca já toma posse da Sé de São Marcos em trajes cardinalícios. Bento XVI inovou e deixou de fora o Patriarca Moraglia.
Também ficou de fora o seu conacional e prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Dom Gerhard Müller. Como prefeito do principal dicastério da Cúria Romana, sua não inclusão é de fato surpreendente. Os “cardinalistas” – uma especialização entre os vaticanistas – punham-no no topo de suas listas.
Bento XVI, criando apenas 6 cardeais, se ateve ao teto estabelecido pela legislação. No dia 23 de novembro, o Cardeal Renato Martino completa 80 anos e o número dos cardeais eleitores cai para 114. No dia seguinte, com a criação dos novos cardeais o Colégio volta a contar com 120 eleitores. Apenas 14 dias depois é a vez do Cardeal Eusébio Scheid completar 80 anos e, assim, o número dos eleitores cai novamente para 119.
No que tange à precedência entre os cardeais, embora ainda não tenha sido oficialmente formulada, já se pode prever: a inclusão de Béchara Raï entre os cardeais-bispos, na condição de patriarca oriental; Baselios Thottunkal, John Onaiyekan, Jesús Salazar e Luis Antonio Tagle entre os cardeais-presbíteros, já que são arcebispos residenciais; e, entre os cardeais-diáconos, somente John Michael Harvey. Este último, entretanto, está no topo da lista para que, passados 10 anos, ao optar pela ordem dos presbíteros, preceda aos demais cardeais-presbíteros criados neste mesmo consistório.
Neste consistório não há sequer um cardeal honorífico, ou seja, todos têm menos de 80 anos e são, portanto, cardeais eleitores. Entre eles, inclusive, os dois mais jovens cardeais do colégio: Thottunkal e Tagle, de 53 e 55 anos respectivamente.
Há um norteamericano (Harvey), um latinoamericano (Salazar Gómez), um africano (Onaiyekan), um indiano (Thottunkal), um libanês (Raï) e um filipino (Tagle). Dois são de rito oriental (Raï, maronita, e Thottunkal, malancar).
Harvey, cuja nomeação para Arcipreste de São Paulo fora dos Muros foi antecipada pelo Papa, é o atual Prefeito da Casa Pontifícia há quase 15 anos. Trabalhava anteriormente na Secretaria de Estado. Desempenhará, portanto, seu primeiro ofício propriamente pastoral na cura da Basílica Papal. Com a criação de Harvey, o número dos cardeais estadunidenses chega a 19, sendo 11 eleitores. O anúncio da nomeação de Harvey é, necessariamente, o da renúncia do Cardeal Francesco Monterisi aos 78 anos. O arcipreste “emérito” não ficará à toa, pois hoje mesmo foi nomeado membro da Congregação para os Bispos.
Béchara Raï figurava em todas as listas. Embora ainda viva seu predecessor, Cardeal Sfeir, Raï é o patriarca da mais importante das igrejas orientais sui juris, a Maronita, e desempenha um papel crucial no Líbano, em particular, e no Oriente Médio, em geral. Ao incluir Raï, o Papa deixou de fora o Patriarca dos Melquitas, Gregorios Laham, que parecia ter a vez no sistema de alternância entre os patriarcas orientais. De toda forma, Laham já tem mais de 78 anos e poderá ser incluído, a título honorífico, entre os cardeais não votantes em futuros consistórios.
Sem dúvida o nome mais inesperado é o do arcebispo-maior dos Malancares. A Malancar é uma pequena Igreja oriental sui juris com pouco mais de 500 mil fiéis na Índia. Alguns poucos milhares se acham na diáspora, sobretudo nos EUA. Só recentemente tornou-se um Arcebispado-Maior, o que na prática a equipara a um patriarcado. Seu Arcebispo-Maior, chamado Catholicós na tradição persa, será o primeiro cardeal malancar. O curioso é que Baselios Thottunkal será o segundo cardeal indiano criado em 2012; em fevereiro foi criado cardeal o Arcebispo-Maior dos Malabares, George Alencherry, também ele oriental. Com a criação de Thottunkal, os dois chefes das igrejas de São Tomé, Malabar e Malancar, estão no Colégio Cardinalício. Outro detalhe digno de nota é que as quatro Arquidioceses Maiores sui juris – as duas indianas já citadas, a Ucraniana e a Romena – estão representadas no Colégio Cardinalício.
Salazar Gómez é o único latinoamericano da lista. É arcebispo de Bogotá, primaz da Colômbia, desde julho de 2010, sucedendo ao cardeal Pedro Rubiano Sáenz que completou 80 anos em setembro último. Havia três outros postos cardinalícios a serem ocupados no continente americano, dois na América Central e um no México. O Papa deu preferência à América do Sul. Em breve, Rio e Salvador vão engrossar a lista dos postos vacantes no continente americano.
A situação africana é mais delicada. Dada sua condição de evangelização recente, a África não tem postos cardinalícios propriamente ditos. Espera-se que no futuro ou Luanda (Angola), ou Douala (Camarões), ou Abdijan (Costa do Marfim), ou Antananarivo (Madagascar), ou Maputo (Moçambique), ou Kampala (Uganda) venham a ter novamente algum cardeal. O Papa preferiu dar um terceiro cardeal à Nigéria, contra todas as previsões. No dia 1º de novembro, porém, o Cardeal Arinze completa 80 anos e, assim, no momento da criação, Onaiyekan será o segundo cardeal nigeriano eleitor.
Outro nome previsível era o do arcebispo de Manila nas Filipinas. O país asiático é o de maior número de cristãos no continente; como o minúsculo Timor Leste, tem maioria católica entre os seus habitantes. Com cerca de 70 milhões de fiéis, as Filipinas são o quarto maior contingente católico do mundo, ficando atrás apenas de Brasil, México e Estados Unidos. Não obstante tais credenciais, as Filipinas estavam sem cardeais eleitores desde agosto. Luis Antonio Tagle será o terceiro cardeal, juntamente com Vidal e Rosales, mas o único votante. Incluindo-o, Bento XVI deixa de fora o também jovem arcebispo de Cebu, Serofia Palma, que poderá ser incluído num futuro consistório.
Três dos seis futuros cardeais são do oriente. Do médio, Raï, e do Extremo, Thottunkal e Tagle. Ausências notáveis são o Arcebispo de Seul (Coreia), o de Tóquio (Japão), o de Karachi (Paquistão) e o de Bangkok (Tailândia). Não é possível, todavia, criar todos os cardeais numa só fornada sem ultrapassar o limite autoimposto de 120 cardeais eleitores.
É bastante provável que o Papa faça em 2013 outro consistório, em que terá a chance de criar mais uma dezena de cardeais, entre os quais estarão um ou dois brasileiros, Orani Tempesta do Rio e Murilo Krieger de Salvador. Estará, assim, inaugurando o ano da Fé com um consistório pequeno e concluindo, com outro maior.
Fonte: OBLATVS
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